quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Chegada

Você chegou, como chega a ventania antes da tempestade. Você me encantou, como se encantam as crianças com pequenas mágicas de salão. Você apareceu na esquina, veio com passos suaves, olhou para a cor que tinham meus olhos. Só consegui balbuciar um olá ansioso. Eu me joguei na cama. Sorri até amanhecer. Os olhos brilhando refletiam a alegria de quem ignora o amanhã. E agora, sou eu quem vai pedir para me afogar quando você me mostrar seu mar revolto de devaneios. Sou eu quem vai calar quando você disser que é carnaval. Sou eu quem vai tentar mais uma vez quando as peças forem colocadas na mesa.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Partida

Você sumiu, como somem as crianças no supermercado. Você me deixou, como se deixa uma nota de um real no chapéu do artista de rua. Você dobrou a esquina, seguiu com passos firmes, não olhou para trás. Não me deu chance nem para te ofender. Eu me joguei na cama. Chorei até amanhecer. Os olhos inchados não tinham mais o brilho de quem escuta o seu nome. E agora, sou eu quem vai pedir para respirar quando você estiver afogado no seu mar de alegrias. Sou eu quem vai abafar o grito quando você estiver em êxtase. Sou eu quem vai desistir quando acabarem suas peças.

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Cartinha para o Papai Noel

Querido Papai Noel,

Este ano eu vou pedir de presente de Natal uma resposta. Sei que não é um presente comum e talvez seja até um pouco complicado de achar, mas, por favor, leve em consideração que eu não costumo pedir presentes e que este ano eu me esforcei em me comportar bem.
A resposta de que eu preciso, apesar de difícil de achar, é bem simples. Infelizmente não poderá ser útil a muita gente. Acredito que só servirá para mim. Mas seja bondoso, Papai Noel, e pondere que tão logo eu recebê-la, ajeitarei minha vida e, assim, poderei tornar a vida de todos a minha volta muito mais fácil.
Meus pais, quando eu era criança, nunca puderam me dar uma resposta. Quando adolescente, procurei com diversos amigos, em vários bares, experimentando coisas novas, mas não encontrei. Achei que, com minha mesada ou salário, poderia comprá-la em shoppings, feiras, supermercados, mas logo percebi que não seria possível. Por vezes acreditei que minha resposta estivesse em outros cantos do planeta. Procurei e procurei, mas os maravilhosos momentos só me davam a sensação de que eu cada vez mais carecia de resposta. Agora, Papai Noel, começo a desistir e recorro ao senhor quase em desespero. Por favor, bom velhinho, me dê uma resposta de Natal.
Não precisa ser laranja, não precisa ser perfumada. Não tenho preferência de tamanho, idade e cor de cabelo. Preciso somente que se encaixe nesta pergunta: Por quê?

Muito obrigada,
AutoCrítica

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Lembranças do esgoto

Você estragou a beleza das minhas músicas. Agora todas cheiram mal, cheiram a você. As boas lembranças da última vez em que elas foram tocadas estão afogadas no seu vômito. Não consigo mais ouvi-las sem ter a certeza de que será necessário desinfetá-las, uma a uma, de sua podridão.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Um copo de fim

Hoje me embriago de lembranças, de músicas, de dores, de lágrimas. Bebo toda a recordação disponível, até que a última gota escorra lentamente até o fundo do meu poço de infinitos pesadelos. Viveremos, os dois, com essa história atada a nossos corpos, para sempre. Tudo o que acontecer daqui em diante terá esse prefácio, essa introdução. Não, esquecer não é possível. O passado não passa, ele fica. E só porque tatuagem e cicatriz são clichês, não vou fazer metáforas nem comparações.

domingo, 4 de novembro de 2007

Obrigada. Hoje não.

Não me mate de tédio hoje. Não me olhe desse jeito. Não faça com que eu tenha que forçar um sorriso. As palavras me traem. Os gestos podem me denunciar a qualquer instante. Não, não me deixe sucumbir no meio do seu discurso. Pode escutar a respiração ofegante? Não, não é por você. É por tudo o que não está acontecendo.